
Sentada olha o mar como se apenas o vazio se encontrasse à sua frente. Não sabe quem é, não se lembra em que ano nasceu, de si nada sabe. Na sua mente pululam memórias ofuscadas, que não tem a certeza de serem suas e desenha na areia com os dedos marcados pelo negro que lhe preenche as unhas, o corpo, a alma. “Alguém há-de vir buscar-me!” Não é um desejo, não é um medo….é apenas e só uma constatação. Não sabe o que quer, nem sequer sabe aquilo que não quer….não tem sonhos, não tem ideais…vai para onde lhe disserem, faz o que os outros quiserem!
Levanta-se decidida a lavar a alma na brisa marinha, a encontrar o que perdeu (a inocência? o sentido de justiça? a capacidade de sonhar?....quem sabe?!), mas os seus olhos apenas vislumbram o vazio, e o vazio nada lhe devolve. Não sente conforto no silêncio, mas não gosta das palavras….está esgotada, sente-se oca, perdida.
Alguém lhe estende uma mão…. Diz-lhe que sente a sua falta e ela vai….por ir!
Não tem motivação, não tem querer… ouve o que os outros lhe dizem… segue indicações e cumpre, sempre com sacrifício, aquilo que julga ser o esperado. E segue. Navega sem mar, sem rumo.
Articula palavras que muitos não reconhecem, não entendem como suas…. Não a conhecem, mas isso já não importa porque ela também não se conhece. Há muito que deixou de acreditar. Não percebe se está a viver ou não, porque não se sente viva, mas algo lhe diz que também não está morta. Vive, qual sanguessuga, através da energia dos outros, porque não sabe sobreviver de outra maneira. Lembra-se do colo, do aconchego, da protecção, mas não os quer, rejeita-os, odeia tudo o que representam. Quer a sua segurança, mas não quer perder o que julga que tem. E explora, e espezinha e faz com que tudo pareça cinzento, porque não consegue esquecer a tristeza de não saber apreciar um dia de sol. Nada valoriza, nada a valoriza….nem sequer o sorriso, porque até esse perdeu.
Sente-se triste e caminha…. Segue uma estrada poeirenta num caminho que parece não ter volta. Deixa-se entranhar pelo pó que a asfixia, mas não se importa. E vai e volta, e torna a ir e torna a vir.
E os outros sempre de braços abertos, cumprindo tudo o que exige, mudando, moldando, ajudando, fazendo o impossível para que se sinta feliz. Ainda não perceberam…..
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"Podemos dar um barco a alguém, podemos colocar esse barco na água e ensinar esse alguém a remar. Mas para que a pessoa reme, é preciso que ela queira remar."
Provérbio chinês